Educação em Minas Gerais- Preocupação é ofertar bom conteúdo e atender todos, diz secretária de Educação
Após dois meses suspensas, as aulas da rede estadual de Minas Gerais serão retomadas na próxima segunda-feira (18) de forma remota. Em entrevista exclusiva a O TEMPO, a secretária de Estado de Educação, Julia Sant’Anna, explica como será retomada e quais as estratégias adotadas pelo Estado para atender 1,7 milhão de alunos.
Como vai funcionar o regime remoto de aulas da rede estadual? Os alunos e professores já estão podendo baixar na internet os nossos Planos de Estudos Tutorados (PETs), que são um caderno de atividades. Para cada ano de escolaridade e cada tipo de curso existe um específico, com todas as disciplinas. É uma orientação de estudos e de atividades relacionadas ao conteúdo. Na segunda-feira, vamos começar a transmissão das aulas na Rede Minas pelo “Se liga na Educação”, o programa que foi montado pelos nossos professores, e também será disponibilizado o aplicativo para Android. Nesse aplicativo, os professores e alunos vão poder ter acesso ao material e às teleaulas gratuitamente, porque toda a navegação dentro do aplicativo vai ser paga pelo Estado em um convênio com as empresas de telefonia. No dia 25, será disponibilizada, dentro do aplicativo, uma ferramenta de chat, em que o professor vai poder interagir com os alunos. A previsão de disponibilidade para iOS é nas próximas semanas, estamos com a expectativa de que ainda seja em maio.
Como e por quem esses PETs foram elaborados? Temos uma escola de formação composta por profissionais que já têm muita experiência nessa preparação de material. Além deles, participaram outros professores da rede, inclusive os que estão preparando o programa da Rede Minas. Contamos também com a participação de professores das secretarias municipais da educação. O material dos anos iniciais foi composto por professores dos municípios, uma vez que a maioria das escolas que atendem anos iniciais são municipais, então eles têm a metodologia já bastante consolidada. Os PETs estão sendo preparados mensalmente. A gente divulgou o primeiro mês, o segundo está em fase de diagramação, estamos pensando em abordar conteúdos anteriores de revisão do inicio do ano letivo.
Como os PETs poderão ser acessados por quem tem e por quem não possui acesso a internet? Os PETs são baixados no site, se o aluno tiver internet em casa já é possível baixar. A partir do dia 18, tendo celular e cobertura de celular na região, ele poderá baixar no celular sem pagar o consumo de dados. No dia 18 mesmo, nossos diretores já farão o acompanhamento de aluno por aluno e, para aqueles que realmente tiverem dificuldade de baixar nesses dois formatos, os diretores farão a impressão e a entrega. Estão sendo pensadas as mais diversas estratégias, cada realidade é uma realidade, então já se fala em associação de moradores ajudando nessa distribuição, médicos de família. Como serão casos que acreditamos que sejam muito pontuais e específicos, estamos deixando essa preparação para a distribuição do material analógico para os diretores de cada escola, e esse acompanhamento vai ser feito por nós.
Qual o número de estudantes sem internet no Estado? Esse número é ainda basante questionado, o ter acesso a internet varia muito, porque depende, você pode não ter internet instalada em casa, mas você ou seu pai pode ter um celular e conseguir baixar o material. É importante criar essas diversas estratégias, você não precisa usar todas elas para ter acesso, elas se sobrepõem para que a gente consiga alcançar o máximo de alunos possível. Essa preocupação com nossa diversidade geográfica e social é latente, somos um Estado muito desigual, um retrato do Brasil. Não é o ideal, mas o que pode ser melhor do que isso? Não é o modelo que a gente gostaria, mas esse modelo foi montado em Minas Gerais com as melhores experiências do Brasil, de todos os aprendizados que vêm acontecendo tanto em situações de deficiência e restrições geográficas e sociais historicamente em Estados, colhemos muita experiência em Estados como Amazonas e Pará, e experiências mais recentes dos demais Estados que estão trabalhando também nessa situação relacionada à pandemia.
Como serão as aulas na Rede Minas? Por quem elas serão ministradas? São 18 professores nossos, alguns estão em sala de aula, outros são nossos formadores, que participaram da consolidação do currículo de referência de Minas Gerais. Esse grupo fez a organização desse material e está à frente das aulas. Todas as disciplinas são agrupadas em quatro áreas de conhecimento: linguagens (língua portuguesa, estrangeira, literatura, artes e educação física) serão às segundas-feiras; ciências humanas (geografia, história, sociologia e filosofia), às terças; matemática, às quartas, e ciências da natureza (dependendo do ano de escolaridade ciências ou biologia, física e química), às quintas-feiras. A sexta-feira a gente separou exclusivamente para o Enem. A transmissão gravada começa às 7h30 e vai até 11h15. Das 7h30 às 9h vai ser um conteúdo voltado para o ensino médio. No meio da manhã, o conteúdo para anos finais do ensino fundamental e, mais perto do almoço, para alunos dos anos iniciais. Das 11h15 às 12h30, acredito que é o grande diferencial de Minas, vamos ter um período ao vivo com professores daquela área de conhecimento que vão estar no estúdio, e os alunos poderão tirar dúvidas por telefone ou WhatsApp. Esses conteúdos que serão trabalhados na Rede Minas serão os mesmos dos PETs, que são separados por semanas. Cada semana tem uma orientação para o aluno fazer um grupo de atividades, para ele não acumular tudo durante o processo.
Durante as aulas ao vivo, alunos de todas as faixas etárias vão esclarecer dúvidas ao mesmo tempo? As dúvidas vão ser todas num momento só. A forma de explicar para os alunos de anos inciais uma dúvida pode tirar, talvez, uma deficiência de aprendizagem de um aluno que está no 7º ano e que não tinha se dado conta de que não sabia aquilo. A gente entende que todo esse processo de esclarecimento de dúvidas vai ser útil para essa compreensão mais global do conteúdo, estamos bem otimistas. Isso vai ser testado na semana que vem, vamos estar atentos, qualquer necessidade de adaptação vamos fazer. Sabemos que vamos ter que ir melhorando todos esse processo, que é novo para todo mundo, ao longo do tempo.
Qual a cobertura da Rede Minas no Estado? A Rede Minas chega a 186 municípios, cobrindo 1 milhão de alunos. Nós temos 1,7 milhão de alunos no total, com cada estratégia vamos conseguindo abarcar um grupo de alunos, é um grupo bastante expressivo, estamos também em contato com outras televisões públicas e buscando aumentar parceria para aumentar a cobertura. A gente sabe também que muita gente faz uso de antenas parabólicas, se na sua casa não pega a Rede Minas em canal aberto, mas tem serviço de antena parabólica, a transmissão vai ser feita também pelos canais de antena parabólica.
E para quem não tem acesso a TV ou internet? Para aqueles alunos que vão ficar desassistidos, a gente faz a entrega do material de forma analógica, de forma impressa. Cada diretor está levantando se os alunos têm acesso a internet, telefone celular, isso tudo vai ser montado um a um, o que a gente quer é garantir a entrega do material analógico. Ainda não vimos nenhuma solução complementar que não afete mais diretamente a questão do isolamento social do que a impressão de um material bem feito e com conteúdo que vai ser trabalhado em forma de diagnóstico no retorno das aulas.
Como está sendo o trabalho de preparo dos professores? Estamos com um cuidado muito grande com a preparação de guias práticos e orientações para que o professor consiga fazer bom uso do material. Muita gente fala que não houve formação para esses professores, mas não houve formação para ninguém. Fomos acometidos por uma pandemia, ninguém estava preparado, e agora temos que conseguir fazer o melhor da forma possível. A gente sugere que alunos e professores assistam às teleaulas. Uma experiência interessante para o professor é pedir que os alunos assistam às aulas para, depois, realizar toda a parte de interação discutindo as principais dúvidas.
Como será o calendário letivo agora? Agora a nossa maior preocupação é ofertar esse bom conteúdo, porque com a MP do MEC, que está em tramitação no Congresso, e as deliberações já publicadas pelo Conselho Nacional de Educação, a gente deixa de falar de dia letivo, e passa a falar de cumprimento de carga horária. A gente tinha muita clareza que eram 200 dias letivos, agora a gente passa a entender que são importantes as 800 horas e que precisamos trabalhar de forma síncrona e assíncrona. O calendário depende muito da retomada, de quando cada município e o Estado vão conseguir reativar as aulas, reativação essa que não tenho nenhuma previsão para dar. Quando acaba o ano letivo vai depender muito de retomada das atividades, do diagnóstico que vai ser feito, são questões que a gente ainda não consegue responder.
Como será a retomada das aulas presenciais? Quando houver esse retorno, estamos com foco em três pontos principais: o primeiro é trabalhar a acolhida do aluno, a gente está vendo nas nossas próprias famílias, entre nossos conhecidos, pessoas acometidas da doença, vai ser um momento importante para trabalhar o lado não cognitivo dos alunos, conversar sobre isso, tornar isso presente, digerir isso também dentro da escola. Para além disso, é fazer o diagnóstico sobre o que foi possível passar de aprendizado para os alunos nessas atividades remotas. Vai ser aplicada uma avaliação diagnóstica e, a partir disso, vamos entender quem conseguiu avançar e quem teve restrição, porque posso conseguir entregar, mas o aluno pode estar numa residência bastante frágil, tanto em termos sociais quanto sanitários. Não necessariamente quer dizer que ele vai aprender, a gente tem que ter cuidado com o diagnóstico depois. O terceiro ponto, a partir do diagnóstico, é como desenhar esse programa quase que exclusivo, pessoal para esse aluno, o que ele não aprendeu, como fazer essa transmissão do conteúdo, para a gente ter certeza de que todo esse processo está sendo coberto.
Há movimentos na internet de alunos de todo o país em prol do adiamento do Enem. Como a senhora vê essa situação? Nacionalmente, os secretários estaduais de educação estão bem engajados nesse processo, logo que o MEC começou a anunciar a manutenção do cronograma, fizemos contato, solicitando que esse planejamento seja construído em conjunto. Mais do que dizer se sou a favor de adiar ou manter a data, o que a gente vem pedindo agora é que se faça essa discussão de forma mais coletiva, porque nós somos os operadores do terceiro ano de ensino médio, somos nós e a rede privada. A gente sabe que o Inep está muto atento às situações dos cronogramas do ensino superior, porque é para lá que a gente deseja que nossos alunos vão. Defendemos entender as restrições e possibilidades de adaptação de cada um para que possamos, principalmente, fazer um discurso de serenidade: “não fique preocupado porque vai haver condições de você fazer um bom Enem, mesmo nessa situação de pandemia, você não será afetado, não haverá risco ao seu futuro”. Acho que isso que a gente não está conseguindo do governo federal. Ter mais serenidade e menos afirmação nesse momento seria algo que traria mais tranquilidade à sociedade.
Fonte: O Tempo